sábado, 3 de dezembro de 2011

The True Story*

Ela era uma criança doce, sempre de sorriso nos lábios, com o sonho de ter um irmão, com o desejo de poder abraçar os seus pais todos os dias... 
Dizem que era uma criança crescida para a idade, que a permanente convivência com o mundo dos adultos a tornou assim... dizem que era calma, que não fazia grandes asneiras, tomara, nunca a deixavam fazer. 
Lembro-me que ela era extremamente sensível, que era frágil, que não aguentava presenciar a morte do mais insignificante dos animais, que não aguentava ver ninguém a chorar, que não suportava ver alguém a discutir. 
Lembro-me que era  uma criança extremamente lenta e redondinha no seu tempo de primária e que todas as suas amigas eram muito mais magras, bem mais bonitas algumas até mais audazes... contudo, sempre aparentou ser extremamente feliz, sempre aparentou não dar importância a isso... bem, quantas e quantas vezes ela chorou por isso. 
Sempre foi o orgulho do seu pai... ele dava tudo por ela, fazia tudo para a ver sorrir e dado a todo este empenho, ela passou a poder abraça-lo todos os dias. 
Sempre foi uma criança muito bem sucedida, sempre conseguiu alcançar os seus objectivos, com esforço, com dedicação, com gosto... era a menina engraçada da família, aquela que tinha as boas notas, aquela que fazia rir toda a gente, aquela em que todos "apostavam".
Aos onze anos viu sair da sua vida um dos seus maiores pilares. Viu-o sair de uma forma tão injusta, tão brusca, demasiado triste. E com onze anos ela conseguiu sentir a dor, o desanimo e a angustia que todas as outras pessoas sentiram, e com onze anos ela conseguiu manter a postura que muitas pessoas não conseguiram manter... com onze anos, ela ainda deveria ser uma criança... deveria. 
Lembro-me que quando era suposto ser uma pré-adolescente, teve de saber ser uma pré-adulta. Porquê? Porque na altura ninguém tinha paciência para ouvir as suas crises, ninguém tinha paciência para parar e conversar com ela, para perguntar se estava tudo bem, para perguntar como correu o seu dia na escola, para perguntar se precisava de alguma coisa. E porque? Porque partiam do principio que devido aquela sua maneira crescida de agir, estava sempre tudo muito bem, que ela conseguia tudo. Aquela saída repentina causou efeitos secundários em algumas pessoas de modo a que ela tivesse ficado, de certa forma, subentendida.  
A dada altura, a doce criança, frágil e facilmente adorável começou a tornar-se fria, revoltada e começou a adoptar uma personalidade aparentemente forte,  absolutamente indestrutível. Continuou a ser a menina das boas notas mas aquela com quem ninguém se metia, aquela que não tinha medo de nada, de ninguém... aquela que fazia o que quisesse, quando quisesse e ninguém tinha nada a ver com isso. O mais irónico de tudo isto? Ninguém percebia como é que aquela doce e inofensiva menina tinha mudado tanto... Deixou de ser a menina do paisinho e passou a ser a sua dor de cabeça. 
Os anos foram passando, algumas atitudes começaram a ser atenuadas até que chegou o dia em que ela conseguiu ser o seu próprio orgulho... tinha uma boa imagem, tinha excelentes notas, tinha os melhores amigos do mundo a seu lado, tinha uma relação fabulosa com os seus pais e conseguira alcançar todos os seus objectivos estipulados para aquele ano. E lá de cima, daquele palco que para muitos podia ser insignificante mas que para ela, por todo o seu trabalho e dedicação, significava muito, ela conseguiu ver o brilho daqueles dois pares de olhos e automaticamente, conseguiu sentir o brilho dos seus próprios olhos. Era como se o olhar daquele pai estivesse constantemente a transmitir a toda a hora e minuto "esta é a minha menina, este é o meu orgulho" 
E nessa noite, alguém muito sábio e de uma maturidade absolutamente venerável citou a seguinte frase "Joana, tu vais longe".
As apostas subiram juntamente com a sua confiança e eis que chega a altura de dar um salto para um patamar mais alto, eis que chega a hora de mais uma vez ela mostrar o que vale. 
Teve com ela todo o apoio do mundo, teve os seus pais mais uma vez a fazerem tudo por ela, tudo para dar certo e surpresa das surpresas.... ela não consegue. E de repente sente-se a ser sugada por um buraco negro que lhe vai destruindo os sonhos e que não lhe dá hipóteses de voltar a sair de lá.
Chega o momento em que começa a olhar à sua volta e se depara com uns pais desanimados por darem tudo de si e não a verem a triunfar, uns indivíduos superiores que fazem questão de contribuir para que  aquele sentimento de inutilidade que a possui vá aumentando e a sensação de que não é exemplo para ninguém, que desistir é o melhor caminho... e é frustrante, é horrível ela saber que toda a gente depositou nela grandes metas e que agora talvez se fiquem por esperar para ver se ela chega a meio da corrida.
É deprimente ela ter a perfeita noção de que era muito e que agora é basicamente nada. 
Ainda assim, ainda que inutilmente, ainda que muito pouca gente lhe transmita optimismo, ela continua, com a esperança de que um dia consiga ver novamente aquele brilho. 
Ainda assim, ela continua a aparentar ser extremamente feliz, continua a aparentar não dar importância a isto. 
Bem, quantas e quantas vezes eu choro por isto. 














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Joana Silva